Umbanda Hoje

O CONGÁ E OS TRABALHOS
DE EXU

     Não temos dúvida de que muitos umbandistas, médiuns e fiéis,  já viram ou tomaram conhecimento que alguns terreiros costumam isolar/tapar e não acender a luz do Congá antes do início e durante o correr de uma sessão/gira de exus e pombagiras, realizando um ato a que os mais antigos na religião conhecem como Fechamento de Congá. E para tal, utilizam cortinas feitas de diversos tecidos, uns mais opacos, outros mais transparentes,  e suprimem a iluminação, visando como acima afirmamos e agora ressaltamos, separar, segregar, dissociar, desatrelar a imagem representativa do Congá das atividades mediúnico-espirituais dos exus e pombagiras, dando a entender que tais atos (deixar o Congá apagado e cortinado) simbolizam (muitos acreditam no efeito real dos atos) que os trabalhos alí a se realizarem não teriam o aval, a concordância ou chancela e sustentação da Corrente Astral de Umbanda e da cúpula espiritual do terreiro. Deixamos claro, antes de continuarmos,  que o Congá é muito mais do que imagens justapostas, velas acesas e outros itens dispostos em sua estrutura. Sua posição de destaque dentro do terreiro, que o faz ser o principal ponto visual, têm finalidades muito além do que alguns imaginam (vide matéria nº 40 de nosso acervo). 

     Não é de hoje que inúmeros médiuns e assistentes se perguntam e/ou questionam certos dirigentes do porquê (ou porquês) que tais atos (fechamento e ausência de iluminação do Congá) são realizados, não só nos terreiros aos quais são vinculados, como também em outras casas umbandistas. Quando não silenciam ou jogam evasivas ao vento, como resposta afirmam ser hábito, praxe, costume, tradição; que reproduzem o que aprenderam e param por aí, deixando o questionador com as mãos vazias de explicação. A situação se complica quando alguns dos dirigentes que têm o costume ou tradição de executar tais medidas (fechamento e falta de iluminação do Congá) justificam tais ações com afirmações completamente infundadas, contraditórias, despidas de lógica, bom senso,  arrepiando os cabelos dos mais atentos e sensatos. Em linhas gerais, dizem que o ato de tapar, fechar cortinas, vedar, isolar e deixar apagado têm como fim separar o divino/sagrado (representado pelo Congá) do mundano (do mundo), representado pelas atividades dos exus e pombagiras, ligadas mais ao cotidiano material e emocional das pessoas. Também afirmam que tais atos de segregação visual entre o Congá e o salão de trabalhos no qual exus e pombagiras trabalharão são uma maneira de “cegar” o Congá das atividades “questionáveis” vindouras, bem como não “inibir/constranger” os próprios trabalhadores espirituais já referidos, que ficariam “encabulados” em realizar certos tipos de trabalho sob os “olhares” do Congá. Não podemos deixar de citar que alguns destes dirigentes vão mais longe, radicalizando sua visão e conduta distorcidas sobre o trabalho de exus e pombagiras. O que eles fazem? Tratam de “reservar” espaço fora do salão de atividades mediúnico-espirituais, como corredores, quintais etc., “carimbando” exus e pombagiras como entidades espirituais indignas de estarem e trabalharem no mesmo ambiente físico de outros espíritos atuantes no terreiro, numa inaceitável e extremada segregação. 

     Leitor amigo, espantado ou apenas incomodado com o que foi dito sobre o assunto? Infelizmente, no entanto, é o que acontece e é dito em certos terreiros em que repousa uma visão distorcida de exus e pombagiras, e que encontra campo de atuação no pensar e agir de alguns dirigentes, que acabam por influenciar o corpo mediúnico, no todo ou em parte, a ver como procedimentos normais quando o Congá não é iluminado e as cortinas são fechadas (na maioria dos terreiros o Congá não tem cortinas ou coisas do gênero) antes do início de uma sessão/gira destinada aos trabalhos de exu e pombagira. 

     Para uma melhor análise reapresentaremos as três justificativas apresentadas por aqueles que costumam isolar, segregar e deixar apagado o Congá por ocasião de uma sessão/gira de exus e pombagiras, com eventuais comentários: 

  1ª Justificativa – Cobrir/cortinar e deixar sem iluminação o Congá em sessão/gira de exus e pombagiras é costume/tradição, aprendido pelo dirigente em outro terreiro ou com outro dirigente e repetido automaticamente na casa que comanda administrativamente/materialmente. 

     Embora discordemos, parece-nos que a explicação acima referida é menos grave do que as outras. E assim dissemos porque nesta situação atestamos a falta de interesse do dirigente em saber a causa (ou causas) de executar o ato reproduzido em seu terreiro, limitando-se a imitar, como se robô fosse, uma prática  absorvida de outro lugar ou de outro dirigente. Neste caso a situação é facilmente revertida, bastando a busca de conhecimento sobre o assunto para mudança de comportamento. 

2ª Justificativa – Cobrir/cortinar e deixar sem iluminação têm por fim separar a representação do divino/sagrado (Congá) do mundano (do mundo), representado pelas atividades dos exus e pombagiras, ligadas mais ao cotidiano material e emocional das pessoas. 

     Aqui a situação alcança um nível diferente da simples ignorância (falta de conhecimento), uma vez que não há mera imitação mecânica de fechamento de Congá (cortinas estendidas e sem iluminação), mas sim clara distorção conceitual a respeito dos espíritos que se apresentam com as “roupagens” já mencionadas, além de uma notória exclusão das atividades dos exus e pombagiras do campo divino/sagrado, como se as entidades espirituais que utilizam tais arquétipos (exus e pombagiras) de apresentação estivessem dissociadas, à parte, à margem do universo religioso em que atuam. Quem se afiniza ou adota as explicações em questão, forçosamente entende que tais entidades são apensos, penduricalhos nos terreiros, que se apresentam em uma instituição umbandista para realizar tarefas paralelas e duvidosas, apartadas das bases e diretrizes da religião e que, pela justificativa que manifestam tais dirigentes, são desabonadoras, são dissociadas dos princípios que norteiam a Umbanda e, portanto, eles, os exus e pombagiras, não comporiam ou seriam elos integrantes do agrupamento espiritual do templo umbandista, tampouco parte da Corrente Astral de Umbanda. 

3ª Justificativa –  O ato de segregação visual (Cobrir/tapar e deixar apagado) entre o Congá e o salão de atividades no qual exus e pombagiras vão trabalhar é uma maneira de “fechar os olhos” do Congá das atividades que acontecerão alí, bem como não “inibir/constranger” os próprios trabalhadores espirituais já citados, que ficariam “encabulados”, pouco à vontade para realizarem certos tipos de trabalho sob a “vigilância” do Congá.  

     E agora, leitor? Você que nos acompanhou até este momento, consumindo atentamente cada linha desta matéria, o que pensar? Bem, tão ou mais grave que a segunda justificativa, pedimos licença para não dissecarmos esta última “explicação” adotada por alguns para o fechamento de Congá. Blindemos nossa mente contra insanidades. 

     Quanto aqueles que arrumam um “cantinho” nas dependências externas do terreiro para as atividades de exus e pombagiras, “afastando-os” do salão de trabalhos como se fossem  vilões espirituais desgarrados, um mal necessário e tolerado, mas não integrantes da corrente espiritual da Casa, uma só palavra: Lamentável!! 

     Chegando ao fim, não poderíamos deixar de salientar que todas estas principais justificativas apresentadas para o intitulado Fechamento de Congá, as quais rechaçamos, são de iniciativa dos dirigentes/diretores mediúnicos de culto, de encarnados, de pessoas, de indivíduos. Por que se alguém disser que isolar/cobrir/cortinar/tapar/vedar e deixar o Congá sem iluminação para que exus e pombagiras possam chegar e trabalhar, ou ainda relegá-los a um canto qualquer das dependências externas do terreiro, é ordem emanada do guia-chefe/mentor espiritual do terreiro, aí afirmamos: O leite azedou!!!! 

            Saravá, Umbanda!