Umbanda Hoje

CORPO MEDIÚNICO: É PRECISO SELECIONAR 

A presente exposição, cujo título por si só já exprime uma clara ideia de seu conteúdo, por certo fará com que calos fiquem doloridos, unhas sejam roídas, sonos sejam perdidos. No entanto, o que nós sinceramente esperamos é que haja reflexão serena e objetiva sobre a questão a ser discorrida, com a consequente implantação das necessárias e pertinentes cautelas.

            Não é nossa intenção promover inseguranças ou desequilíbrios na comunidade umbandista, mais do que os já existentes. Mas se tais acontecerem, que sejam considerados efeitos, reflexos, desdobramentos de determinados eventos causados pela omissão de alguns que, por ignorância, comodidade, receio, ou cumplicidade, fogem das responsabilidades que lhes cabem na direção material de um Templo de Umbanda. E tal omissão deve ser prontamente combatida, sob pena de, em não havendo a necessária correção, observarmos fatos desagradáveis se avolumando dentro de nossa esplendorosa Umbanda.

         Excluindo-se as razões de ordem espiritual para que Beltrano ou Fulano se integre a um terreiro, seja para resgate, evolução ou missão, cuja responsabilidade é do Mentor Espiritual ou Guia-Chefe da instituição, nossa alusão tem por escopo apontar a ausência ou extrema precariedade do processo de seleção material dos indivíduos que almejam fazer parte do corpo mediúnico de nossa religião.

           Não obstante os hercúleos esforços de abnegados irmãos de fé, no tocante ao esclarecimento e conscientização quanto à seriedade, responsabilidade e renúncia que o sacerdócio umbandista impõe a seus aspirantes, verifica-se ainda ser muito fácil o acesso ao colegiado mediúnico na grande maioria dos terreiros. Durante uma sessão ou gira, basta haver uma instabilidade biopsicomotora, ou a solicitação para ingresso e, dias depois, lá está o indivíduo fazendo parte da corrente mediúnica, sem ter sido alvo de um processo de triagem por parte da presidência, apto a detectar indícios sobre quem é o novo integrante, de onde vem, o que faz, e suas intenções em relação ao templo e à religião. Quem pode garantir que o novo integrante não seja uma pessoa que esteja necessitando somente de tratamento espiritual? Ou que não seja um criminoso tentando se ocultar ou infiltrar em um ambiente sadio? Ou que o mesmo não tenha vislumbrado a oportunidade para dar vazão a seus desvios de comportamento (vaidade nociva, egocentrismo, complexos, luxúria etc.)? Ou ainda que o indivíduo não esteja atrás de atos ilícitos e imorais?

            Estas e outras questões carecem de uma profunda e detida avaliação daqueles que presidem um Templo de Umbanda, sem as quais poderão colocar em risco o funcionamento a bom termo do labor mediúnico-espiritual.

            Somos contrários ao pensamento de alguns de que a esfera espiritual é a única a ter responsabilidades de coordenação e movimentação dos terreiros. Não! A direção ou presidência do estabelecimento religioso funciona de forma compartilhada entre a Espiritualidade e os encarnados, em harmonia, cabendo ao Guia-Chefe ou Mentor da Casa as atribuições de caráter extrafísico e ritualístico, e ao presidente as de cunho legal (de Lei) e administrativo. É evidente que se houver divergências prevalecerá as diretrizes do Comandante Espiritual, cuja linha de conceitos, trabalhos e decisões devem sobrepor-se as do administrador físico.

            Muitos problemas existentes nos espaços religiosos de Umbanda poderiam ser evitados, ou ao menos minimizados, se houvesse regras de seleção rígidas para ingresso no corpo mediúnico. Não se trata aqui de tentativa de elitização dos sacerdotes, mas sim a expressa vontade para que exista uma checagem apurada e permanentemente ativa no que diz respeito aos futuros veículos de manifestação dos espíritos, que serão corresponsáveis pela cura, pelo conselho, pelo consolo, enfim, pelo destino de inúmeros indivíduos que recorrem à Umbanda. E para tal, é curial que os médiuns sejam indivíduos com boa base moral, doutrinária e disciplinar, capacitados a cumprirem as tarefas que lhes foram confiadas pelo Criador Universal.

            E como averiguar, ainda que de modo superficial, se o aspirante possui as condições básicas para tornar-se um novo elo da corrente mediúnica do templo? Implantando critérios rigorosos para sua admissão, respondemos. Quais? Nossas observações e experiência dentro do Movimento Umbandista nos levam a afirmar que a primeira providência a ser tomada pelo administrador é expor ao candidato, de forma clara e precisa todas as etapas pelas quais ele, o interessado, terá que se submeter para ser considerado apto ao sacerdócio umbandista naquele espaço de caridade, além de dar conhecimento das normas de conduta moral, hierárquica e disciplinar sob as quais a instituição religiosa desenvolve suas atividades. Pré-requisitos tais como entrevistas, investigação social, frequência obrigatória a curso básico doutrinário, também devem ser de ciência do pretendente. São medidas que afastarão a maioria dos postulantes com intenções reprováveis.

            Asseveramos ser imprescindível ao progresso da Umbanda-religião a adoção de medidas para se alcançar um volume qualitativo maior daqueles que queiram integrar a coletividade de sacerdotes. É lógico que poderão surgir casos especiais,  por exemplo, o de um candidato que denote uma grande capacidade mediúnica, além de ser possuidor de boa educação e moral notórias, mas que não saiba ler/escrever, ou que não tenha escolaridade. Para estes, por uma questão de bom senso, deverá ser aplicado um tratamento compatível com a situação.

            Nossa religião ainda se constitui em um vasto campo para aproveitadores da fé, da crença, e do desespero alheios. E esta permissividade é reflexo da desídia, da imprudência e do menosprezo com que alguns tratam o tema sacerdócio umbandista, que não se resume a mediunismo como vociferam alguns, mas é, antes de tudo, uma filosofia de vida à disposição dos espíritos para a caridade.

            Salve a nossa Iluminada Religião!